Encontro do dia 03 de Dezembro de 2024
Hoje o tema do nosso treino foi "Acrobacias", pois alguns alunos tinham me perguntado se iríamos trabalhar isso na semana passada.
Aquecimento: Treino de base usando a caminhada em meia lua onde juntamos as pernas brevemente com os joelhos dobrados e damos passos largos em plano médio. Sempre com os joelhos dobrados esse é um ótimo exercício para se aquecer e treinar a base. Essa caminhada exige que os braços estejam ativos para manter o equilíbrio e, de fato, após 10 minutos disso o corpo fica bastante aquecido. Para estimular uma atmosfera artística pedi para que dessem o passo todos juntes, assim tínhamos a formação de um coro.
Acrobacias de plano baixo, médio e alto: Dedicamos em torno de uns 10 minutos para treinar os seguintes movimentos: Rolamento de frente e de costas, ponte, andar na ponte, macaquinho, estrelinha, twist de mãos e pés.
Acrobacias em dupla: Fizemos alguns equilíbrios em duplas: meia altura e levantadas com apoios diversos.
Reflexões sobre uma postura artística:
Como o treino de hoje foi muito físico e técnico a distração foi maior entre os participantes do que quando estamos trabalhando exercícios especificamente estéticos. Porém, isso não deve acontecer nesta aula, pois se o participante não tiver uma atitude de criação estética e artística em todos os momentos (mesmo quando está executando um exercício técnico) o que diferencia nossa prática de uma aula de educação física?
Evidentemente que o trabalho que fazemos é muito físico e pode ser utilizado apenas para treinar o condicionamento e flexibilidade do corpo sendo a minha proposta por vezes jocosamente chamada de "crossfit cênico". Essa expressão tem um fundo de verdade, pois, de fato, um bom treino dentro desta proposta deixa o corpo suado e trabalhado. Não obstante, enquanto atividade puramente física não se trata de um bom treino, uma vez que carece de precauções, progressões e planos de atividades fortalecedoras que apenas alguém especializado em condicionamento físico poderia proporcionar, seja ele um educador físico formal ou não (no sentido de que existem outras formas de educação física que possuem conhecimentos deste tipo, mas não se enquadram numa educação institucionalmente formalizada). Portanto, mesmo ao exercitarmos o corpo por meio de acrobacias, não se trata de apenas realizar uma atividade física, mas sim de um processo estético.
Um bom exemplo desta prática foi o último exercício deste treino no qual investigamos em duplas formas diferentes de se carregar e apoiar no corpo do outro. Em grande contraste com a atitude dos participantes no resto do treino, neste exercício todos ficaram em silêncio, concentrados na ação que estavam executando. E, como resultado, vimos uma transformação da atmosfera da sala de uma sala de aula para uma sala de performances.
Essa transformação se deu por causa de uma atitude mental, uma disposição afetiva que não se resumia a executar exercícios físicos, mas também a entrar numa "viagem" estética. Uma tal atitude, ao meu ver, se assemelha à atitude dos arqueiros ZEN como descritos por Herrigel em seu famoso livro. Na prática japonesa que ele descreve os arqueiros têm como alvo um pequeno circulo a menos de 3 metros de distância. Quem já praticou arqueria ou tiro ao alvo sabe que 3 metros é uma distância ridiculamente fácil de se atingir o alvo, então porque os mestres arqueiros ZEN tentam um feito tão fácil? A resposta não está na obtenção do objetivo final (atingir o alvo), mas no processo de realizar a ação física (atirar a flecha), processo pelo qual o arqueiro atinge o seu próprio Eu e, com isso pode receber alguma iluminação. Esse é um processo espiritual para os arqueiros no qual eles realizam uma atividade material (praticar aqueirismo) para a obtenção de objetivos não materiais (no caso a obtenção do estado de nirvana). No caso da nossa prática acrobática, o que a diferencia de uma prática exclusivamente desportiva - que objetiva apenas realizar tecnicamente a acrobacia - é a atitude de criação estética na qual o artista acessa aquele estado diferenciado de atenção, concentração e afetividade que caracteriza uma performance cênica. Tendo esta atitude, toda ação se torna artística, desde escovar os dentes até realizar uma acrobacia.
E é essa amplitude de aplicação desta atitude que potencialmente pode envolver a totalidade da vida de alguém que a aproxima, ao menos ideologicamente, de uma prática ZEN ou até mesmo de uma prática espiritual. Pode o teatro ser espiritual? Se puder, este me parece ser um dos caminhos mais propício.
Registros:
Parte 1:
https://youtu.be/nQRJA11Ro6I
Parte 2:
https://youtu.be/bKb-5-iDeWc
Parte 3:
https://youtu.be/JngZyTJ0WnQ
Parte 4:
https://youtu.be/wSh-IDM6Y_s
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